7ª edição - ano II - Fevereiro / 2010
Olá, amigos! Sejam bem-vindos!
Agora que as folias de Momo se foram e o ano começa de verdade, aqui estamos mais uma vez em nossas tentativas cotidianas de reflexão, poesia e arte. E apesar da ressaca e das inúmeras batalhas que ainda virão no decorrer do ano, combateremos o bom combate.
Grande abraço a todos e boa leitura!
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Big Brother
Isso mesmo, meu irmão!
Seja grande!
Seja big, brother!
Você pode!
Basta olhar pra câmera
e sorrir,
sem vergonha ou medo,
se exibir.
Mostre bem ao mundo
o seu rosto,
o seu corpo e seus desejos,
o seu gosto.
Escancare a todos
sua alma
e abra mão também
da sua calma.
Você não precisa de paz,
você tem mais!
Tem mais fama que os outros filhos
dos teus pais.
Não precisa nem saber falar
e nem mesmo ter o que dizer.
Ninguém liga a TV pra se informar.
Todos querem apenas se entreter
assistindo você no paredão,
suplicando por clemência como um cão.
Todos querem te ver
sob o edredom.
Vasculhar sua intimidade
é muito bom.
Todos querem te olhar
no ofurô.
Privacidade é uma coisa
que acabou.
Todos querem te ver
dissimulado
pra não ser no final
eliminado.
O que dá audiência
é um mar de lama,
pra ver quem fica por último
no programa.
E o mais triste, meu irmão,
que isso tudo revela,
é que você não se sente ninguém
se não estiver em close up na tela.
E mesmo fora dela é a mesma porcaria:
a vigilância se tornou epidemia.
Na avenida, elevador ou portaria
existe sempre um aviso de: sorria...
[ Marcelo Souza ]
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Tentativa de poesia 3475
Eu lembro, vagamente... era dia e eu era livre.
Eu pintava o sol com pássaros feitos de rabiscos.
E por rabiscar mais e mais, eu me tornei o rei dos rabiscos.
E isso é ser mais livre que um desenhista.
Acho que era verão... foi antes das artes plásticas nascerem.
Eu lembro que, bem pequenininho, eu inventei um teatro
E preparava as peças sem saber ler nem escrever,
E, então, eu tinha um grande talento e era o diretor e o ator.
Eu era o público e o crítico e batia palmas pra todas as minhas peças.
Saber ler também me analfabetizou.
E um dia, não sei como, uma máquina fotográfica parou nas minhas mãos.
E, então, eu possuí o mundo.
Eu captava tudo com os meus olhos de super-herói.
Tinham as cores e as cores eram minhas.
Tinha a menina bonita – e ela era minha, no meu teatro, dentro do meu dia,
Dentro da máquina fotográfica dos meus olhos.
Tenho certeza, era verão porque nunca anoitecia. Nunca dava a hora de entrar.
E eu descobri a música estrangeira e descobri que também falava inglês.
Vejam só, eu sabia falar inglês, francês, espanhol e todos os outros idiomas – embora poucos ouvissem os outros idiomas.
Era só ouvi-los uma vez e, pronto, eles eram meus.
Sim-sim, com certeza era verão porque eu nunca fiquei gripado.
Com a vassoura de casa, eu toquei minha guitarra no palco do Maracanã.
Com a minha banda, a gente botava pra quebrar e balançava os cabelos e fechava os olhos.
E pulava, e corria.
Foi antes da faculdade de música.
Ah, e quantos campeonatos de futebol eu ganhei no Maracanã??!!
Caramba!! Fiz um gol de bicicleta, depois de um toque de calcanhar e de ter agarrado um pênalti, depois que o goleiro se machucara... Caramba!!
E os meus amigos me abraçavam e a gente sempre comemorava no meu teatro...
Era verão sim porque todos eram livres e não estavam doentes.
E a gente fazia planos e mais planos e mais planos.
A gente até fez o plano de fazer planos pra vender...
Claro que era verão porque não tinha professor e as pessoas sabiam.
E eu tinha três desejos e, no último, eu pedia mais três e assim enganava o gênio.
E usava todos pra pedir pro outono não chegar...
É.... foi assim... eu bem me lembro...
[ Máximo Heleno ]
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Na casa de Irene

Achada a carne entre os desejos, não havia aquele véu intermediário e esperado. Não era um conto, nem uma fábula sonhada. De alguma maneira sabia disso ainda que não pensasse. Até porque o tempo inexistia naquele cubículo: o vôo ágil da mariposa insistente, a cor azeda das paredes, o cheiro forte e acre em movimento, a penumbra transformada em sua íntima semântica, o calabouço típico de um prazer assimilado. Tudo ao mesmo tempo e às avessas.
Um corpo: nítido. Que a palma tateava sem conforto. Era preciso ser direto, por sua expectativa, pela praticidade dela, pela recorrência do fato. Quantas vezes calculado o passo? A decisão certeira – deveria indagá-la de sua herança de bonecas? Em meio ao mantra confuso de pensar e agir, sorriu imperceptivelmente – ela lhe responderia um palavrão. Ou também ela sorrira?
Consultar então o relógio, cometer aquela boca tão convidativa ao ato. Urge proteger-se, urge armasse, listar paradigmas usuais – sujar-se com todo o proeminente cuidado. Espanhola à brasileira. Falo ereto, felação ligeira – faltou aquela cerveja a mais, um choque a mais no corpo e no espírito.
Por fim, pagar; que a hora é alta, a noite quente, e a fila anda.
[ Luiz França ]
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